18.3.08

A Constituição e a páscoa

A semana santa, que termina no próximo domingo (23), é um dos principais eventos do calendário cristão, no qual é celebrada a ressurreição de Cristo. A data tem uma grande influência em todo o Brasil já que, segundo o último censo do IBGE, (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) realizado em 2000, quase três quartos da população brasileira são adeptos do catolicismo. Apesar desse percentual, e de ter adotado o calendário cristão, o estado brasileiro é laico, ou seja, não se vincula a nenhuma religião específica. Na verdade o que existe é uma grande diversidade religiosa no Brasil. Segundo o último censo do IBGE, existem no país cerca de 20 religiões diferentes que convivem sobre o mesmo solo. Mas como se garante que essa convivência seja pacífica?
Liberdade de Crença

A Constituição tenta garantir esse equilíbrio estabelecendo a liberdade de crença e de cultos religiosos como um direito fundamental. E quando se fala em direitos fundamentais, estamos falando de garantias que só podem ser derrubadas se for escrita outra Constituição. Daí então a importância que a Assembléia Constituinte de 1988 deu à essa questão quando escreveu a Lei atual. Também é garantido que ninguém será impedido de fazer algo, ou de entrar em algum lugar, ou mesmo ser privado de algum direito por causa da sua convicção religiosa. Por exemplo, aqueles que forem chamados a servir ao exército, caso essa atividade seja contra os princípios da sua religião, podem pedir para prestar um serviço alternativo, mas já não podem alegar motivos religiosos para não cumprir esse serviço alternativo.

Isenção de Impostos

Na própria Constituição já está estabelecido que o governo não pode cobrar impostos sobre templos religiosos de qualquer tipo de culto. Essa é uma maneira também de tentar retirar qualquer barreira à liberdade de expressão religiosa.

Religião nos tempos do Império

Antes mesmo de o Brasil se tornar uma república, logo após a independência, a religião católica apostólica romana era adotada como religião oficial do império. Isso estava inclusive estabelecido na primeira Constituição brasileira, que vigorou de 1824 a 1891. Quem tivesse uma outra religião, não podia expressar a sua fé em público, e nem votar em eleições para deputados, mesmo que cumprisse outras exigências da época para o voto, como a renda mínima de 400 mil réis. Mas mesmo com todas essas restrições, a Constituição de 1824 ainda estabelecia que ninguém podia ser perseguido por motivo de crença religiosa, desde que não ofendesse o comportamento moral da época.

A coluna sobre a Constituição é uma parceria com a Rádio UFMG Educativa, 104,5 fm. Os artigos são escritos por Larissa Veloso e têm a coordenação de Tacyana Arce.

11.3.08

A Constituição e os estrangeiros




Desde a última semana o governo brasileiro e o espanhol enfrentam uma situação delicada no que diz respeito ao trânsito de estrangeiros entre os dois países. O desentendimento começou quando cerca de 30 brasileiros foram impedidos de entrar na Espanha na última quarta feira (5). Segundo relatos, alguns deles tiveram que esperar por até 3 dias em uma sala do aeroporto de Madri, e chegaram a ser insultados por policiais espanhóis. Em resposta a esses acontecimentos o Brasil adotou o chamado princípio da reciprocidade, e endureceu a fiscalização sobre os passageiros vindos da Espanha. Com isso, mais de 10 turistas espanhóis que não estavam com os documentos em dia com as exigências brasileiras foram devolvidos à Espanha. Mas será que esse tal princípio da reciprocidade é sempre usado como um instrumento de retaliação?

A Constituição também fala sobre a relação do Brasil com outros países, e o tratamento que os estrangeiros devem ter em solo brasileiro.

A Reciprocidade

O princípio da reciprocidade está previsto na Constituição com relação aos portugueses, visto como um mecanismo de garantia, e não de punição. O artigo 12 diz que os portugueses que moram no Brasil podem ter os mesmos direitos que um brasileiro, desde que Portugal adote a mesma medida com os brasileiros que moram lá. Ou seja: que os brasileiros residentes em Portugal tenham os mesmos direitos que os portugueses. Esses direitos incluem até mesmo o de votar nas eleições e de se candidatar a deputado e senador... Só não está incluído o direito de ser presidente do país, ou presidente do Supremo Tribunal Federal, da Câmara e do Senado.

Casos de deportação e extradição

Para o caso de deportação, como é o caso das pessoas que são barradas nos aeroportos, existe a lei 6.815, que é também o estatuto dos estrangeiros. Essa lei lista diversos casos em que as pessoas devem ser enviadas de volta a seus países, como no caso de imigrantes clandestinos, ou aqueles que não estiverem em dia com toda a documentação que o Brasil exige aos estrangeiros. Mas a Constituição prevê uma exceção. Ela não permite que o Brasil acate o pedido de extradição feito por outro país quando o estrangeiro é acusado de crime político em seu país. Isso, justamente para proteger o estrangeiro que pode estar fugindo de uma situação desfavorável no seu país. No meio do ano passado, logo depois do Pan-Americano, houve até uma polêmica envolvendo esse assunto, quando dois pugilistas cubanos tentaram permanecer no Brasil depois que a sua delegação já tinha ido embora. Na época foi questionada a extradição deles porque alguns consideravam os dois como refugiados políticos do regime de Fidel Castro. Mas segundo a Polícia Federal, eles tiveram que voltar para Cuba porque o visto que eles tinham não permitia a permanência por um período superior aos dias em que eram realizados os jogos Pan-Americanos.

Estrangeiros que moram no Brasil

Logo no início do artigo quinto, que é aquele que fala dos direitos fundamentais, como o direito à vida, à liberdade, à segurança, nesse artigo a Constituição já inclui os estrangeiros que moram no País como tendo as mesmas garantias fundamentais que um brasileiro. A Constituição também fala sobre a naturalização, e veio inclusive facilitando esse processo para os estrangeiros ao longo do tempo. Pra se ter uma idéia, em 1988 os estrangeiros filhos de mãe ou pai brasileiro que quisessem se naturalizar, tinham que ter morado no Brasil enquanto eram adolescentes ou crianças. Em 1994, passou a ser exigido somente que o interessado tivesse morado no Brasil, em qualquer época. No ano passado, esse processo se tornou ainda mais fácil: a mãe ou o pai brasileiro que tiver um filho no exterior, só precisa registrar a criança aqui no Brasil, quando ela nascer, e quando essa criança fizer 18 anos, ela já pode pedir a nacionalidade brasileira.

A coluna sobre a Constituição é uma parceria com a Rádio UFMG Educativa, e vai ao ar todas as terça feiras por volta de 12:30. Os textos são escritos por Larissa Veloso e têm a Coordenção de Tacyana Arce.

imagem: Tratado de Tordesilhas - créditos

8.3.08

A Constituição e as mulheres


Esse sábado marca um dia trágico na história da luta pelos direitos humanos. Há mais de 150 anos, um grupo de mulheres que trabalhavam em uma fábrica de tecidos em Nova York nos Estados Unidos decidiu fazer uma greve por melhores condições de trabalho. Elas trabalhavam até 16 horas por dia, mas ganhavam menos que os homens, às vezes apenas um terço do salário deles. Segundo a história, a repressão a esse movimento foi dura, e as mulheres foram trancadas na fábrica, que foi incendiada. Essa tragédia aconteceu no dia 8 de março de 1857, e esse dia ficou conhecido como o dia internacional da mulher, e das lutas pela igualdade entre os sexos.

A Constituição de 1988 foi a primeira a falar de igualdade entre os sexos, principalmente dentro de casa. Logo no início do artigo quinto está escrito que homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações. No capítulo sobre os direitos da família, a Constituição também diz que os direitos e deveres referentes ao casamento devem ser exercidos igualmente tanto pelo marido quanto pela esposa. Isso na prática quer dizer que o homem não pode se recusar a ajudar a mulher no cuidado com os filhos, e ela não precisa pedir permissão ao marido para poder trabalhar, como acontecia no início do século 20. Essas questões parecem simples, mas é bom lembrar que elas nem mesmo eram mencionadas nas Constituições anteriores.

Direitos Tabalhistas

A primeira Constituição que mencionou o trabalho da mulher foi a de 1934, escrita durante o governo Vargas. Essa constituição trouxe uma série de garantias trabalhistas para os brasileiros em geral e proibia o trabalho noturno para mulheres. Mas para o sexo feminino o que importou mesmo foi um conjunto de leis que se seguiram à Constitução de 1934: a CLT, a Consolidação das Leis Trabalhistas, aprovada em 1943, na qual há um capítulo inteiro sobre os direitos da mulher. Lá está estabelecido, por exemplo, que é proibido divulgar anúncios de emprego com restrição ao sexo, ou que não se pode dispensar uma candidata a um cargo só pelo fato de ela ser mulher, ou também que a mulher não pode ganhar menos que o homem quando executa uma função igual à dele.

Violência Contra a Mulher

Nesse sentido nós temos um importante avanço, que foi a lei Maria da Penha, aprovada em agosto de 2006. Essa foi a primeira lei não apenas a tratar dos abusos que muitas mulheres sofrem, muitas vezes pelos próprios maridos, mas também a estabelecer políticas de combate contra a violência doméstica. A lei Maria da Penha também tornou mais severas as punições aos agressores, permitindo que eles sejam presos em flagrante, e foi a primeira a estabelecer a criação de delegacias especializadas para atender as mulheres. O nome da lei é uma homenagem à biofarmacêutica Maria da Penha, que ficou paraplégica depois que o marido lhe deu um tiro nas costas. Ela lutou 20 anos para ver o agressor condenado.

A coluna sobre a Constituição é uma parceria com a rádio UFMG Educativa, 104,5 fm. Os textos são escritos por Larissa Veloso e têm a coordenação de Tacyana Arce.